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Como o convite de Cyndi Lauper para sua turnê de despedida salvou a vida da DJ Tracy Young


A DJ e produtora vencedora do Grammy revela como a turnê de despedida de Cyndi Lauper se tornou sua ressurreição após um luto e uma depressão devastadores.

Por Christopher Wiggins
30 de junho de 2025 – 16h24 (horário local)

Há um brilho na voz de Tracy Young hoje em dia — uma espécie de exultação silenciosa — que permeia cada sílaba, mesmo quando ela relembra os capítulos mais sombrios de sua vida. “Estou radiante”, ela admite com uma risada, uma confissão de alegria tão vulnerável quanto qualquer coisa que já tenha dito. “Nunca, em um milhão de anos, pensei que voltaria a ser feliz.”

Aos 54 anos, a DJ premiada com o Grammy, produtora musical e fundadora do selo FEROSH Records, se encontra em um ponto alto inesperado — justamente porque sobreviveu a vales que quase a engoliram por completo. Em uma entrevista profundamente pessoal à revista The Advocate, Young falou com franqueza sobre luto, reinvenção, sobriedade e o poder transformador da música — que a salvou repetidas vezes.


Há alguns anos, o mundo de Young parecia estar no auge. Em 2020, ela ganhou um Grammy histórico pelo remix de “I Rise”, de Madonna — tornando-se a primeira mulher a vencer na categoria de Melhor Gravação Remixada, Não-Clássica. E então, como ela relembra: “Veio a COVID. E depois minha mãe sofreu um segundo incêndio.”

Os acontecimentos desencadearam uma tragédia em série. Young mudou sua mãe da Pensilvânia para um novo apartamento depois do incêndio. Pouco tempo depois, seu padrasto morreu repentinamente na frente da mãe, e então sua mãe faleceu durante o sono. “Vai fazer quatro anos em fevereiro”, ela diz suavemente. “Então tem uns três anos e meio, talvez nem isso.”

Sua mãe era sua “maior fã”, e a perda deixou um silêncio que Young não sabia como preencher. “Fiquei tão deprimida”, ela admite. “Achei que... sei lá. É a coisa mais louca. Nunca pensei que voltaria a ser feliz.”

Foi a música — e um pouco de sincronicidade divina — que ofereceu a ela uma tábua de salvação.

“Estava no Pride de D.C. no ano passado, e recebi uma ligação”, relembra Young. Ela havia procurado a equipe de Cyndi Lauper para oferecer-se como DJ dos after-parties da turnê de despedida da artista. “Nunca pensei na turnê toda.”

Mas logo, Young foi convidada não apenas para a turnê europeia de estádios de Lauper, em fevereiro, mas também para toda a etapa norte-americana da Girls Just Wanna Have Fun Farewell Tour, com apresentações de costa a costa em julho e agosto.

Para Young, uma mulher lésbica assumida, este é um momento profundamente pessoal e profissional. Sua relação com Lauper remonta há mais de 20 anos, começando com seu remix da música “Shine”. É uma amizade que incluiu aparições surpresas — como quando Lauper apareceu na festa de aniversário de Young no Level Nightclub, em South Beach, nos anos 2000 — e colaborações como o projeto “Hope” durante a pandemia e uma grande apresentação na véspera de Ano Novo na Times Square.

“Ser convidada para participar da turnê de despedida da Cyndi foi como um sinal do universo”, diz Young. “Eu estava num lugar emocional muito profundo após perder minha mãe, e essa oportunidade reacendeu meu espírito. Me lembrou por que me apaixonei pela música - pela conexão, pela comunidade, pela alegria.

Young é a DJ oficial do pré-show da turnê, responsável por energizar milhares de fãs antes de Lauper subir ao palco. Ela está criando sets imersivos e vibrantes que passam por synth-pop, disco, house, new wave e remixes raros - incluindo novas versões exclusivas de clássicos de Lauper. Seus sets incluem intros personalizadas, edições inéditas e surpresas específicas para cada cidade.


“Não é um set pré-programado”
, explica Young. “Pesquiso sobre cada cidade que vamos. Sempre toquei ao vivo dessa forma.”

Parte desse reencontro com si mesma vem de um processo interno. “Estou sóbria”, revela Young. “Nunca fui uma festeira, mas houve um momento em que me desviei um pouco.”

E o luto teve um impacto físico real. “Eu estava com uns 23 quilos acima do peso”, confessa. “Comecei a realmente voltar a ser eu.” Ela credita a Lauper não apenas por trazê-la de volta à música, mas por inspirá-la a recuperar sua saúde. “A Cyndi me fez voltar à academia. Queria perder peso, queria estar bem, queria ter músicas novas e estar preparada para tudo.”

Ela acrescenta: “Eu não estava fazendo nada. Estava tão deprimida.”


Hoje, seus dias incluem meditação, exercícios e uma nova consciência. “Estou lembrando dos momentos”, diz ela. “Estou muito presente. Estou clara.”

Para Young, trata-se de resgatar uma alegria que ela achava ter perdido para sempre. “Conheci pessoas novas, estou feliz em Miami, e nem sempre estive feliz aqui”, diz. “Estou envolvida de novo com minha vida.”

É fácil falar de Tracy Young em termos de marcos: tocou nos maiores clubes do mundo, remixou lendas como Madonna, Cyndi Lauper e K.D. Lang, e quebrou barreiras como mulher em um setor ainda dominado por homens. Mas, por trás das pick-ups, ela sempre buscou algo mais profundo.

“Queria criar memórias para as pessoas”, diz. “Aqueles momentos de: ‘Meu Deus, você lembra daquela festa?’ Queria surpreender as pessoas. E nunca quis que fosse sobre mim.”

Ela cita seu remix icônico de “Defying Gravity”, que voltou à tona recentemente com o burburinho em torno do filme Wicked. “A gravadora não queria lançar”, ela relembra. “Toquei em Londres uma vez, postei no MySpace - viralizou, o que quer que isso significasse na época - e então lançaram.” Ela sorri com a lembrança. “As pessoas falaram.”

Mesmo após décadas na indústria, Young ainda encontra alegria nesses caminhos inesperados. “É como uma música nova outra vez”, diz ela sobre o ressurgimento da faixa nas plataformas de streaming. De fato, hoje é a música mais ouvida dela no Spotify.

Ao falar sobre sua família, Young se torna mais reflexiva. Ela compartilha que sua mãe lutava contra doenças mentais, vivendo com transtorno bipolar. “Me preocupava com ela o tempo todo”, diz Young. “Nunca precisei me preocupar só comigo. Sempre me preocupava.”

Essa vigilância constante só recentemente se dissipou. “Vou dormir sem estar preocupada agora”, diz. “E não sei se fazia isso enquanto ela estava viva.”

Ela hesita. “Preferia que ela ainda estivesse aqui. Mas, de certa forma, um peso foi tirado.”

Esse alívio, embora agridoce, lhe deu uma nova perspectiva - e um renascimento artístico. “Estou em um estado criativo incrível agora”, diz. “Estou dentro disso.”

À medida que a turnê de despedida de Lauper percorre cidades de Boston a Los Angeles — incluindo locais icônicos como o Hollywood Bowl e o Jones Beach em Nova York —, Young não dá nada como garantido. “Isso é sobre a Cyndi e o legado dela”, afirma. “Estou lá para apoiar e preparar o público para ela.”

A turnê de despedida de Lauper é mais que um show; é um momento cultural. Desde seu lançamento em 2024, a turnê já arrecadou quase US$ 150 mil para o Girls Just Want to Have Fundamental Rights Fund, por meio de doações de fãs e parcerias com campanhas.

Enquanto isso, Young está moldando seu próximo capítulo com novas músicas e a expansão da FEROSH Records. Ela lançará três grandes colaborações de estúdio entre o verão e o outono: em 25 de julho, estreia “I Know You, I Live You”, com as poderosas vocalistas Niki Haris e Donna De Lory; em 22 de agosto, se reúne com Janice Robinson para o hino “Divine Love Lives”; e em 3 de outubro, lança “WATR”, outra colaboração vibrante com Niki Haris e Donna De Lory, em homenagem ao Mês da História LGBTQ+.

E, sempre, ela permanece devota às pistas de dança. “A dança sempre foi parte de como nós, como comunidade, nos unimos”, diz. “Seja com o HIV, os direitos das pessoas trans ou o orgulho LGBTQ+, celebramos e aprendemos juntos na pista.”

No início de junho, Young - que é natural do norte da Virgínia - voltou a Washington, D.C., para o WorldPride, onde encerrou com um set ao ar livre na Pennsylvania Avenue, à sombra do Capitólio iluminado, diante de uma multidão de dezenas de milhares de pessoas celebrando a diversidade da experiência LGBTQ+.

No fim das contas, é isso que Young espera que as pessoas lembrem dela. “Quero ser lembrada pelo amor”, diz. “Por espalhar alegria. Por criar momentos onde as pessoas podem ser livres.”

Matéria extraída do Advocate


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